A preocupação dos investidores com a falta de clareza em relação às trajetórias dos juros – em particular a partir de 2025 – e da dívida pública, somada às críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Banco Central e a um movimento de especulação no mercado de câmbio, descolou o real de outras moedas emergentes e contribuiu para a moeda brasileira ficar a um fio de cabelo dos R$ 5,60 no mercado à vista, registrando seu pior primeiro semestre ante o dólar desde 2020, ano da pandemia de covid-19.
O dólar à vista terminou o pregão em alta de 1,47%, a R$ 5,5883. Na máxima da sessão, chegou a R$ 5,5990 (+1,66%), o maior preço desde 12 de janeiro de 2022, quando alcançou R$ 5,6007.
Na semana, a moeda subiu 2,71%, e em junho avançou 6,43%. No acumulado do ano, a alta foi de 15,14%, o que corresponde ao avanço mais significativo em relação à moeda brasileira desde os 35,51% registrados no primeiro semestre de 2020.
A alta do dólar ante o real neste primeiro semestre também se destacou quando comparada ao desempenho da moeda americana ante outras divisas de países emergentes. O dólar subiu bem menos em relação à lira turca (11,01%), peso mexicano (7,97%) peso colombiano (7,15%), peso chileno (7,06%) e rupia indiana (0,23%), e em relação ao rublo russo e ao rand sul-africano caiu 4,06% e 0,55%, respectivamente.
No mercado futuro, por volta das 17h55, o contrato do dólar para agosto subia 1,55%, a R$ 5,6125, com máxima intradia de R$ 5,6180. O volume de negócios somava US$ 21,4 bilhões.
Segundo Fernando César, operador de câmbio da AGK Corretora, o fortalecimento recente do dólar ante o real é baseado essencialmente no ceticismo dos investidores em relação à capacidade do governo de promover o equilíbrio das contas públicas. “Os fundamentos não estão ruins, não está aquele bicho feio, mas o mercado está precificando o risco fiscal futuro”, afirma.
“O mercado está carente de respostas”, diz Felipe Schuckar, head de câmbio da Hedgepoint. “Quer escutar o nosso Banco Central, o Poder Executivo dando respostas relacionadas à possibilidade de corte de juros, a questões fiscais que estão trazendo sensibilidade grande”, afirma.
Ele ressalta que o momento é de “grande instabilidade”, e que aos clientes a recomendação tem sido de gerir o risco com operações de hedge, tanto na ponta vendedora quanto na compradora. “O momento é de aceitar margens menores até ter maior clareza”, avalia.
Uma outra parcela da alta do dólar, porém, vem de fora. Rodrigo Jolig, diretor de investimentos da Alphatree, considera que a fraqueza do real está relacionada a um “mau humor generalizado” em relação a moedas de economias emergentes e a fundos que tentam surfar a tendência de valorização do dólar – ainda que o real tenha “apanhado” mais que seus pares.
“O movimento tem sido levado por fluxos bem técnicos. Os investidores são muito grandes lá fora e o real é como se fosse uma commodity”, avalia. “Tem uma tendência de alta do dólar, os modelos acabam comprando mais. Realmente mudou muito a história de seis meses para cá no Brasil? Não, todo mundo sabia que o fiscal era ruim”, acrescenta.