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DATA: 21/02/2018 | FONTE: midiamax 'Brincadeiras' na internet podem terminar em tragédia e pais precisam estar alertas Para especialista, impedir acesso à internet não é solução

Uma febre nas redes sociais, sobretudo no Youtube, são os desafios, ou challenges, em inglês - o do balde de gelo foi um deles, arrebatou até famosos por uma boa causa. Mas, além dessas práticas filantrópicas, existem outras modalidades igualmente populares, mas que podem resultar em consequências trágicas: os jogos de riscos. Tratam-se de 'brincadeiras' perigosas, que na maioria das vezes consistem em maneiras de interromper a oxigenação do cérebro e causar algum tipo de euforia. Obviamente, pode ter consequências permanentes ou até mesmo fatais.

Um dos principais meios de propagação dos jogos de risco está na internet. Youtubers com milhares de inscritos mostram do que são capazes, até mesmo de arriscar a própria vida, em troca de curtidas e popularidades. Entre os fãs, estão principalmente crianças e adolescentes, que assistem irrestritamente ao conteúdo e não obstante reproduzem os desafios na roda de amigos. Os desafios mais populares atualmente são o da canela, do desmaio, do fogo e o do desodorante .

Obviamente, não é incomum que a prática termine em tragédia. Um levantamento da ONG Dimi Cuida, que atua na prevenção aos jogos de risco, contabiliza que são mais de 82 casos nno Brasil, entre 1995 e 2007. Mas o número pode ser bem maior, já que há uma espécie de demanda reprimida - é que muitos dos casos de jogos de riscos que terminam em morte são considerados suicídio pelas autoridades.

 

Todavia, a morte de Adrielly Gonçalves, de 7 anos, que morreu em decorrência de uma parada cardíaca no começo de fevereiro, em São Bernardo do Campo (SP), pode ter uma conclusão diferente. A menina havia sido deixada aos cuidados de uma vizinha quando teria participado do desafio. Quando a mãe chegou em casa, encontrou a filha morta - ao lado do corpo, um tubo de desodorante aerossol. Um inquérito aberto no 8º Departamento de Polícia Civil da cidade investiga se ela pode ter sido vítima de um jogo perigoso.

Longe dos olhos

Casos como o de Adrielly reforçam que existe uma certa inabilidade dos pais mediarem o conteúdo a que os filhos têm acesso. E também apontam que no Brasil esse tipo de prática, que está ao alcance de qualquer um na internet, não tem tratamento adequado. Em alguns países, como a França, Canadá e África do Sul, a prevenção aos jogos de risco recebem a mesma atenção dos governos que a prevenção do suicídio, ou seja, são tratados como problemas de saúde pública. Por aqui, há pouquíssima discussão sobre o tema.

"Nós observamos que os pais têm medo de quando os filhos estão na rua, porque eles podem correr riscos. Risco do assalto, risco do sequestro, de usar drogas, das violências urbanas. Mas, quando o filho está trancado no quarto ou no banheiro, ele está exposto a outros perigos que infelizmente são invisíveis aos pais. São nesses ambientes que os jogos de risco costumam acontecer", explica Luísa Maria Freire Miranda, psicóloga que desenvolve em seu mestrado na UFC (Universidade Federal do Ceará) pesquisa sobre os jogos de risco como um fenômeno da atualidade, uma espécie de espetacularização totalmente inconsequente.

A psicóloga descreve que a sensação de segurança de ter o filho em casa ou por perto pode ser falsa caso os pais não tenham condição de mediar o conteúdo virtual a que jovens têm acesso. "Os pais precisam saber o que os filhos acessam, precisam saber quais os interesses dos filhos. Isso não é invasão, é cuidado. Os jogos de risco são uma realidade e precisamos aprender a prevenir a prática e reconhecer quando ela pode estar acontecendo", explica.

Existem sinais de indicam que o jovem pode estar participando dos desafios. No caso dos jogos que promovem inalações, por exemplo, é comum que vias aéreas como narinas, laringe e traqueia fiquem lesadas. Em outros desafios, como o do fogo, o jovem pode apresentar queimaduras, das mais leves até de 3º grau. Há, também, os desafios de enforcamento, no qual o adolescente tenta ver em quanto tempo consegue se desvencilhar de um cinto no pescoço, que também causa interrupção de oxigenação cerebral – neste caso, ele ficaria com marcas no pescoço.

Popularidade e vontade de experimentar

"O adolescente que participa de jogos tem alguma noção de que aquilo é arriscado, mas pela popularidade e também pela pressão do grupo, ele se expõe ao risco", explica Luísa. Segundo ela, além da busca por popularidade - que claramente se nota em quem posta na internet os vídeos dos desafios que cumprem - jovens também se expõem ao risco pela vontade de experimentar. Em alguns jogos, como o do enforcamento, há relatos de alguma euforia. Resguardadas as proporções, os jogos poderiam até ser comparados ao consumo de drogas. “Ele pode não fazer consumo de maconha ou álcool, mas adota um comportamento em busca de sensações que também podem ter consequências negativas”, conta.

Ao saberem da existência dos jogos, é comum que pais cortem o acesso dos filhos à internet, seja por computadores ou por celulares. Mas, a estratégia pode ser frustrada, segundo a pesquisadora. "Não resolve tirar o wi-fi, até porque ele vai ter acesso de outras formas. Na verdade, ele precisa estar preparado para dizer 'não'. Os pais precisam educá-los de forma a ter a capacidade de se esquivar diante da pressão para que ele entre no jogo", conta.

 

O maior risco, portanto, é a falta de tato de adultos de lidarem com esta realidade, associada à facilidade de acesso tanto às instruções como aos materiais dos desafios: afinal, há desodorante em qualquer banheiro, fogões em todas as cozinhas, cintos em todos os guarda-roupas. “Existe essa ignorância com relação à letalidade das coisas do dia a dia, assim como ignorância de como funciona o corpo humano”, considera.

Escola também ajuda

As escolas, assim como quaisquer ambientes nos quais os jovens passam muito tempo, têm papel fundamental na prevenção à prática dos jogos de risco. “É claro que não podemos responsabilizar uma escola com dois mil alunos por um episódio fatal que eventualmente ocorra, já que os pais também não podem se dar o luxo de nãos e interessar pelo mundo dos jovens ou de terceirizar a responsabilidade da educação. Mas, juntos escola e pais podem unir forças”, explica a psicóloga.

Por meio de nota, a Semed (Secretaria Municipal de Educação) informou que que os professores e profissionais que atuam nas escolas de Campo Grande são orientados a ficarem atentos quanto a essas brincadeiras que surgem no universo escolar, a fim de coibir qualquer tipo de ação que possa ser prejudicial aos alunos.

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