As histórias são mais raras do que no passado, mas ainda machucam. Se a representatividade dos negros cresceu nas delegações olímpicas e paralímpicas do Brasil nos últimos anos, o racismo infelizmente não abandonou o cotidiano destes atletas. Seja no ambiente esportivo ou fora dele, de forma velada ou explícita, o preconceito ainda se faz presente.
Quando se observa as posições de poder do esporte nacional, o cenário ainda é discrepante. Nenhum dos 33 presidentes das Confederações Olímpicas Brasileiras é negro - Gerli Santos foi o mandatário da Confederação Brasileira de Esgrima (CBE) por quatro anos, mas não segue mais no cargo. Entre os principais dirigentes do Comitê Olímpico do Brasil, todos são brancos.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) afirma que mais da metade da população brasileira se declara negra ou parda no censo. Mas nem o COB nem o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) possuem um levantamento preciso sobre quantos eram os atletas negros a competirem na Rio 2016. Como esta declaração de etnia, pelos conceitos do IBGE, é pessoal e voluntária, não podemos precisar a expressão total da participação negra nas delegações nacionais.
No dia da Consciência Negra, feriado estabelecido na data que se atribui à morte de Zumbi dos Palmares, o GloboEsporte.com procurou atletas de diversas modalidades para relatarem os desafios que a cor da pele os fez enfrentar em algum momento de suas vidas.
O tema é tão delicado que muitos grandes nomes do esporte nacional, incluindo campeões olímpicos e mundiais, preferiram manter o silêncio e não se expor. Outros relembraram momentos dolorosos, que até hoje remoem na memória. Mas consideraram que falar e externar tais lembranças seria um ato importante na luta pela igualdade racial. Confira alguns destes depoimentos.
"Hoje morando na Zona Sul tenho um pouco de medo de andar em certos lugares. Eu ando de bermuda, de camiseta e chinelo, e vejo quando olham assim ou assado. Prefiro andar nos mesmos lugares para não me aborrecer com gente que não sabe da minha índole."
"Uma vez fui ver um apartamento em Copacabana para morar e falaram que eu não teria condições de pagar. Depois a pessoa soube quem eu era e o que fazia e voltou atrás, mas eu tinha perdido o interesse. Tenho pena dessas pessoas."
"No Circuito Mundial acho que sou o único negro. O mais difícil é jogar na Rússia. Nunca fizeram nada contra mim diretamente, mas você sente que faz um ponto, não aplaudem como com outros jogadores."
Aline Silva - vice-campeã mundial de luta olímpica
"Na época do judô eu sofria preconceito pelo meu cabelo, pelo meu quimono sempre mais sujo. Eu saí do judô em 2000, e um dos motivos foi o preconceito."
"Minha mãe é assessora e procuradora. Tem gente que não acredita, mesmo com todos os documentos indicando isso. Muitas vezes duvidam dela pelo fato de ser negra."
Jefinho - tricampeão paralímpico de Futebol de 5
"O racismo no geral é sutil. Às vezes é um olhar, uma virada de rosto, e pelo fato de ser deficiente visual eu não percebo esse tipo de coisa. Só quando é falado para perceber, mas assim é muito raro.
"Espero que o preconceito acabe de uma vez por todas. Somos todos iguais. Não é cor que define caráter."